sexta-feira, 11 de abril de 2014

DOCUMENTO NOVO NO PLENÁRIO DO JÚRI. ART. 479 DO CPP (Dicas - Aury Lopes Jr.)


Semana passada ainda explicava em aula (e também está no livro 'Direito Processual Penal', p. 1059 e ss.) a importância dessa restrição e o problema a ser enfrentado pelo juiz presidente neste momento. Diante do documento 'novo' (e relevante) trazido extemporaneamente por uma das partes, ele JAMAIS poderá questionar a outra parte 'se concorda' com o uso em plenário. Esse é um grave erro cometido por alguns, que não se dão conta de que se a parte surpreendida concordar, haverá surpresa e evidente prejuízo para sua atuação em plenário (acusando ou defendendo). É por isso que não pode haver 'surpresa' no júri brasileiro. Já se a parte surpreendida não concordar com o uso do documento, tampouco estará resolvido o problema. Bastará que o interessado explore o 'imaginário' dos jurados. Muito mais interessante do que o real, é o imaginário. Muito melhor do que aquilo que vc vê, é o que vc não vê, mas imagina...

Logo, evidente o prejuízo também. Como resolver essa situação? Com um juiz bem preparado e firme, que imediatamente proíba a utilização do documento novo, com base no art. 479, sem deixar à parte adversa qualquer decisão, pois isso geraria um imenso prejuízo aos olhos dos jurados. Além disso, deve proibir, terminantemente, qualquer menção ou exploração do documento cuja juntada não se deu no prazo devido. Também poderá o juiz, diante da relevância do documento para o processo, adotar um outro caminho, igualmente correto: dissolver o conselho de sentença, determinar a juntada do documento e vista para a outra parte. Após, marcará novo julgamento, em que, obviamente, não poderão funcionar os jurados que tiverem integrado esse conselho de sentença. Aplica­ se, nesse caso, o disposto no art. 481 do CPP.
Agora tomo conhecimento dessa interessante e importante decisão do STJ, exatamente na mesma linha:
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DIREITO PROCESSUAL PENAL. NULIDADE NO JULGAMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI. 
É nulo o julgamento no Tribunal do Júri que tenha ensejado condenação quando a acusação tiver apresentado, durante os debates na sessão plenária, documento estranho aos autos que indicaria que uma testemunha havia sido ameaçada pelo réu, e a defesa tiver se insurgido contra essa atitude fazendo consignar o fato em ata. De acordo com a norma contida na antiga redação do art. 475 do CPP, atualmente disciplinada no art. 479, é defeso às partes a leitura em plenário de documento que não tenha sido juntado aos autos com a antecedência mínima de três dias. Trata-se de norma que tutela a efetividade do contraditório, que é um dos pilares do devido processo legal, sendo certo que a sua previsão legal seria até mesmo prescindível, já que o direito das partes de conhecer previamente as provas que serão submetidas à valoração da autoridade competente é ínsito ao Estado Democrático de Direito. De fato, existem entendimentos doutrinários e jurisprudenciais no sentido de que eventual inobservância à norma em comento caracterizaria nulidade de natureza relativa, a ensejar arguição oportuna e comprovação do prejuízo suportado. Entretanto, não há como negar que a atuação de qualquer das partes em desconformidade com essa norma importa na ruptura da isonomia probatória, a qual deve ser observada em toda e qualquer demanda judicializada, ainda mais no âmbito de uma ação penal – cuja resposta estatal, na maioria das vezes, volta-se contra um dos bens jurídicos mais preciosos do ser humano – e, principalmente, no procedimento dos crimes dolosos contra a vida, em que o juízo condenatório ou absolutório é proferido por juízes leigos, dos quais não se exige motivação. Com efeito, o legislador ordinário estabeleceu, ao regulamentar o referido procedimento, uma peculiar forma de julgamento, já que os jurados que compõem o Conselho de Sentença são chamados a responderem de forma afirmativa ou negativa a questionamentos elaborados pelo juiz presidente, razão pela qual os seus veredictos são desprovidos da fundamentação que ordinariamente se exige das decisões judiciais. Assim, toda a ritualística que envolve o julgamento dos delitos dolosos contra a vida tem por finalidade garantir que os jurados formem o seu convencimento apenas com base nos fatos postos em julgamento e nas provas que validamente forem apresentadas em plenário. No caso de ser constatada quebra dessa isonomia probatória, como na hipótese em análise, não há como assegurar que o veredicto exarado pelo Conselho de Sentença tenha sido validamente formado, diante da absoluta impossibilidade de se aferir o grau de influência da indevida leitura de documento não juntado aos autos oportunamente, justamente porque aos jurados não se impõe o dever de fundamentar. Ademais, ainda que se empreste a essa nulidade a natureza relativa, na hipótese em que a defesa do acusado tenha consignado a sua irresignação em ata, logo após o acusador ter utilizado documento não acostado aos autos oportunamente, não há falar em preclusão do tema. Sobrevindo, então, um juízo condenatório, configurado também se encontra o prejuízo para quem suportou a utilização indevida do documento, já que não se vislumbra qualquer outra forma de comprovação do referido requisito das nulidades relativas. HC 225.478-AP, Rel. Min. Laurita Vaz e Rel. para acórdão Min. Jorge Mussi, julgado em 20/2/2014.

(Fonte: https://www.facebook.com/aurylopesjr/posts/613990472021280)

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