(…) há um severo descompasso entre a
prática jurisdicional e a teoria de que a Constituição de 1988, ao
ampliar os legitimados, teria construído um “sistema de defesa da
Constituição tão completo e tão bem estruturado que, no particular, nada
a fica a dever aos mais avançados ordenamentos jurídicos da atualidade”[1].
Fica evidenciada, nessa análise, que esse tão bem estruturado e tão
completo sistema não tem efetivamente desenvolvido uma verdadeira defesa
dos direitos e garantias fundamentais, tampouco a ampliação dos
legitimados favoreceu esse movimento.
Ao contrário, a Constituição e os
movimentos legais e jurisprudenciais posteriores favoreceram a
construção de um processo gradual, mas efetivo, de retirada de outras
vias, como o controle difuso e concreto, como instrumento para essa
defesa de direitos e garantias fundamentais. A ampliação do controle
concentrado, pouco cidadão e pouco efetivo na defesa de direitos e
garantias fundamentais, vem sendo acompanhada da subtração da
discursividade que acontece no sistema difuso. Em síntese, há um claro
problema que agora começa a ser diagnosticado e que precisa de um forte
debate cívico em torno do papel que devemos esperar de uma corte
constitucional.
A questão a ser enfrentada é a dos
processos de seletividade a partir dos quais são definidos os interesses
que serão tutelados por meio do controle concentrado. Atualmente, há
uma forte seletividade em termos de agentes legitimados (que fortalece o
controle federativo e o corporativo), combinado com uma seletividade
nas decisões judiciais (que privilegiam o controle formal e o material
baseado em regras de estrutura administrativa, e não na eficácia dos
direitos fundamentais). Assim, o problema fundamental não é de
eficiência nem de celeridade, pois importa pouco saber quantos pedidos
serão julgados e quando eles serão decididos, quando existe um
comprometimento estrutural do sistema com redes de seletividade que
contribuem para um esvaziamento das ADIs como forma de efetivação de
direitos fundamentais e de garantia do interesse público. De pouco
adianta concentrar os esforços legislativos, administrativos e
jurisprudenciais na conquista de uma maior eficácia, quando o problema
fundamental do sistema de controle concentrado está nas formas perversas
de seletividade que ele engendra.
Trecho da pesquisa A Quem Interessa o
Controle Concentrado de Constitucionalidade?: O Descompasso entre
Teoria e Prática na Defesa dos Direitos Fundamentais, apresentada na última quarta-feira, 4 de junho, na Faculdade de Direito da UnB.
A pesquisa, financiada pelo CNPq e
coordenada pelos professores Alexandre Araújo Costa (IPol-UnB) e Juliano
Zaiden Benvindo (FD-UnB), contou com a participação de 13 pesquisadores
que analisaram quase 4.900 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI)
ajuizadas no Supremo Tribunal Federal (STF) entre os anos de 1998 a
2002.
Para saber mais, clique aqui para ler o relatório e aqui para ver os gráficos da pesquisa.
Fonte: Faculdade de Direito da UnB.
Foto: Carlos Humberto/SCO/STF.
Nota:
[1]
COELHO, Inocêncio Mártires. “Experiência Constitucional Brasileira: da
Carta Imperial de 1824 à Constituição Democrática de 1988”. In: MENDES,
Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo
Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p.
208.
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